Pequeno, grande, na medida

Noreen Araújo Pradie*

Quarenta graus, temperatura normal em Castilho (SP), e em todo lote que chego me oferecem um cafezinho. Comecei cedo a fiscalização e no meio da tarde já estou fazendo as contas: quantos lotes faltam? Em meio a anotações apressadas, abre porteira, fecha porteira, tem sempre alguém querendo prolongar a conversa e minha cabeça me apressa… ainda faltam tantos lotes para fiscalizar.

Um me conta que a chuva atrapalhou a reforma, outro diz que não tinha pedreiro, mais um reclama do tempo e outros reclamam que o material não deu. “Tive que por do bolso”.

E eu não posso parar, o próximo lote me espera.
Boa tarde, vim ver a obra. Como está? Anota, mede, material, parede, telhado. Ficou bom? Reclamação, elogio, mais ou menos. Obrigada. Boa tarde. Tchau. Próximo lote… a tarde indo.

Lá pelas quatro da tarde, sol alto, um homem arando a terra com um arado puxado a cavalo, coisa de antigamente e nada comum por ali, onde as pessoas trabalham bem mais cedo ou no final da tarde. Ele chama a mulher, que não me oferece um café, só me chama para ver as camas que acabaram de ser entregues.

Eu, meio a contragosto, só pensando em sair correndo para o próximo lote. Aceito o convite e já vou falando a que vim, enquanto a mulher, como se eu tivesse ido até lá somente para ver as camas, nem me dá atenção. Simpatia, fala frouxa e sorriso, me conduz até um pequeno quarto onde mal cabem as camas, mostra duas beliches e diz:

“Este quarto foi feito com o material do Incra, aqui vão dormir as meninas. Agora elas vão dormir separadas dos meninos, acabaram as brigas.”

Parei de pensar no próximo lote e flutuei naquele sorriso pequeno e gigante que me colocou num lugar de descanso. Que prazer, que alívio.

Um quarto para as meninas, era tudo o que ela precisava. Tão pouco, tão simples, sem reclamação, sem elogio. Na medida.

Em Castilho o sol não se põe, apaga. Deu seis horas e o sol ainda alto vai assim até as sete da noite. Mas relógio que presta é o corpo, que fadiga e avisa. Fim do expediente. Qual nada, chegou o fim do expediente e não chegou o fim dos lotes.
Medida certa é quando a vida dá uma trégua para nos mostrar o que realmente importa.

Autor: Noreen Araújo Pradie
Unidade de lotação: SR(08)SP

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