Canindé: referência de luta pela reforma agrária no Ceará

PA Ipueira da Vaca-Familia da assentada Iranise na plantação

O município de Canindé, situado na região Norte do Ceará, é referência histórica na luta dos trabalhadores rurais pela reforma agrária no estado. Foi em Canindé onde ocorreu a primeira desapropriação para fins de reforma agrária no estado, após um grande conflito de terras, que teve como alvo a Fazenda Japuara, em 1971.

De lá para cá, Canindé já soma 39 projetos de assentamento federais e assume o primeiro lugar no ranking do número de assentamentos no Ceará e no Brasil. Os projetos ocupam uma área de 84.240 hectares, com capacidade para 2.139 famílias. Hoje, 1.791 famílias estão assentadas. Estima-se a presença de, no mínimo, 7.164 pessoas em áreas reformadas no município, considerando a média de quatro membros por unidade familiar. Ou seja, dos 27.598 habitantes da zona rural de Canindé, 26% são assentados da reforma agrária.

Objeto de pesquisas

A importância do município para as questões agrárias no Ceará pode ser comprovada pelos estudos acadêmicos (monografias, dissertações, teses, artigos científicos) das mais diferentes áreas do conhecimento que utilizam os assentamentos em Canindé como objeto de pesquisa.

O servidor Paulo Barquete, analista em reforma e desenvolvimento agrário do Incra/CE, foi um dos pesquisadores que abordou a questão agrária em Canindé na sua tese de doutorado em Sociologia. “O município de Canindé foi palco dos primeiros conflitos e lutas pela posse da terra no Ceará. A presença da Igreja Católica e a atuação dos movimentos sociais foram fundamentais para despertar nos trabalhadores rurais um sentimento de luta para conseguirem a desapropriação de vários latifúndios e, por conseguinte, a implantação dos projetos de assentamento”, explicou.

Atualmente, o Ceará concentra 457 assentamentos, com 21.587 famílias, em uma área de 916.172 hectares. Dos 184 municípios cearenses, o Incra está presente em 95.

Mudança de vida

O assentamento Ipueira da Vaca foi o primeiro criado em Canindé, após a implementação do I Plano Nacional de Reforma Agrária, em 1985. A área de 7,5 mil hectares que o projeto ocupa foi fruto de uma doação da Igreja Católica. O assentamento foi criado em 8 de janeiro de 1986, com capacidade para 120 famílias.

A assentada Maria Raimunda Silva de Sousa (conhecida como Iranise), 55 anos, casada e mãe de dois filhos, está no assentamento desde o começo, assim como seus pais e sua irmã que também são assentados. Atualmente, Iranise mora no local com o marido e uma neta e relata suas conquistas após a criação do assentamento.

“Eu nasci e me criei nessa área. Antes as coisas eram muito difíceis. A gente trabalhava para o patrão e não tinha liberdade. Hoje trabalhamos para nós mesmos, no nosso roçado plantamos o que queremos e a forragem ainda fica para os animais. Antes, todos moravam em casas de taipa. Hoje, todo mundo mora em casa de alvenaria, todos tem uma ou duas cisternas, temos açudes, energia e água encanada. Melhorou demais”, relembra.

Créditos e Infraestrutura

A grande quantidade de trabalhadores rurais assentados em Canindé exigiu do Incra/CE uma forte presença na região para fazer chegar aos assentados as políticas de crédito, educação, assistência técnica e infraestrutura necessárias para estruturação dos assentamentos.

Entre 1985 e 2020, o Incra/CE aplicou nos 39 assentamentos existentes no município, cerca de R$ 37,9 milhões em Créditos Instalação, nas modalidades Apoio Inicial, Aquisição de Material de Construção, Reforma, Fomento, Fomento Mulher e Semiárido.

Esses créditos garantiram aos assentados a sua instalação no assentamento, adquirindo bens de primeira necessidade, assim como a construção de suas habitações, implantação de projetos produtivos e, em alguns casos, a segurança hídrica das famílias.

Ao longo desses anos, obras de infraestrutura também foram destinadas aos assentamentos em Canindé. De acordo com dados do setor de engenharia do Incra/CE, nos assentamentos canindeenses foram construídos/recuperados 26 açudes, perfurados e instalados 14 poços profundos, construída uma passagem molhada e 93 quilômetros de rede de eletrificação rural.

As obras de infraestrutura foram realizadas por meio de licitações com empresas particulares e por convênios com o governo do estado e com a prefeitura. No total, o Incra/CE investiu R$ 3,9 milhões na realização destas obras.

Acesso à Educação

As políticas educacionais oferecidas pelo Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera) também alcançaram os assentamentos rurais de Canindé. Em 1998, o Pronera iniciou o primeiro curso de alfabetização de jovens e adultos no Ceará e contou com a participação de 21 alunos dos assentamentos Logradouro, Grossos, Jucurutu, Nova Conquista e Nojosas – todos em Canindé.

Durante os 21 anos de atuação do Pronera, cerca de 1.350 vagas foram oferecidas e preenchidas por assentados e filhos de assentados nos seguintes cursos: alfabetização; escolarização de primeiro e segundo segmento; magistério de nível médio, superior em pedagogia da terra; superior em serviço social; licenciatura em geografia; especialização em agroecologia; residência agrária em extensão rural agroecológica e residência jovem em meio ambiente, saúde, comunicação e cultura.

Arte e Cultura

Os assentamentos localizados em Canindé também se mostraram um terreno fértil para ações culturais. Por meio do Projeto Arte e Cultura na Reforma Agrária (PACRA), idealizado pelo Incra/CE, foi possível apoiar, valorizar e criar condições para que os assentados dessem continuidade às suas iniciativas culturais.

A servidora aposentada Silma Magalhães, coordenou o PACRA durante os 15 anos de existência do projeto. Ela explica que Canindé é o município que concentra o maior número de projetos culturais apoiados pelo PACRA e que o projeto tem o objetivo de facilitar o acesso destes grupos aos editais culturais públicos ou privados, e das diferentes esferas de governo.

“Temos o grupo de Reisado da Família Ramos, no assentamento Ipueira da Vaca, que é reconhecido como tesouro vivo da cultura do Ceará. Temos também o grupo de teatro “Brilho do Sol”, do assentamento Monte Orebe; o Ponto de Cultura “Raizes da Terra”, no assentamento Tiracanga; e a “Casa de Cultura da Reforma Agrária”, que é um espaço com teatro que recebe apresentações/festivais artísticos de outros estados”, explicou.

Titulação

Com tantos assentamentos implantados no município, a maioria com mais de 20 anos de criação, o superintendente do Incra/CE, Luiz Fernando Castro de Paula, conta que os trabalhos caminham agora rumo à titulação. “A maioria dos assentamentos cearenses foi criada de forma coletiva. Precisamos fazer a titulação dessas áreas, para ajudar a desenvolver ainda mais o potencial produtivo daqueles agricultores que sonharam um dia serem donos de seu próprio pedaço de chão,” frisou.

Os primeiros assentamentos da região que se encontram em processo de titulação são o Lagoa Verde e Fazenda Suiça. Ambos criados em 1987, com capacidade para 21 e 50 famílias, respectivamente. Os dois já passaram pelas fases de georreferenciamento e certificação das áreas. O próximo passo é a supervisão ocupacional com o objetivo de verificar o cumprimento das cláusulas resolutivas do Contrato de Concessão de Uso (CCU).

Após essa fase, é iniciada a instrução do processo e feito o levantamento de valor de cada lote. Em seguida o processo segue para o Incra Sede para a emissão dos títulos.

Ascom Incra/CE

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