Apesar de ter me criado num sítio em São Joaquim do Monte, no interior de Pernambuco, não tinha experiência de trabalho no campo. Na cidade, fiz o primário. Em Caruaru, o ginasial, e me formei em 1962, em Vitória de Santo Antão. Concluí o chamado curso pedagógico.
Fui embora pra Recife. Lá, um conhecido, ao saber que eu estava sem emprego, me falou do concurso do Incra, na época, Instituto Brasileiro de Reforma Agrária (Ibra). Eram só quatro vagas de professor, mas consegui passar.
O ano era 1967. Começava a prática de educação no campo para a moça de 27 anos que até então não conhecia um pé de vagem…
Eu e uma colega fomos instaladas no alojamento da escola recém-construída na vila Santa Luzia, em Chã Grande, a 84 quilômetros da capital. A recepção foi calorosa. E tínhamos uma geladeira a gás! Para chegar, a gente saía do Recife, onde fazíamos feira no fim de semana, descia no meio da estrada e andava cinco quilômetros. Os meninos lá, com carrinho de mão esperando.
Eu ia à casa dos alunos, convivia com as famílias. Buscava nos roçados coisas para usar na aprendizagem. Luiz Gonzaga e seu ABC do Sertão, músicas populares, tudo ajudava. Sem muitos recursos, improvisávamos. O projeto durou somente um ano. Saí de coração partido.
O próximo destino foi o primeiro assentamento criado a partir de desapropriação por função social da terra, o Caxangá, em Ribeirão, a 87 quilômetros do Recife. A área abrangia 15 engenhos, em cinco municípios. No inverno, só se chegava de trator. A geladeira foi junto. Pegávamos goiaba, araçá, o que tinha no mato, para fazer picolés.
Também atuei com os assentados na lida da cana-de-açúcar. Outra vez, me sentia recompensada, mas tive que sair de lá em 1973 e nunca mais voltei a campo como servidora. Após anos de serviços administrativos na sede regional do Incra e na autarquia em São Paulo, me aposentei, no início da década de 1990.
Mas naquelas duas experiências, acredito ter feito a diferença com meu trabalho. As pessoas se sentiram “abraçadas” e acho que jamais tiveram ideia do bem feito àquela moça miúda, cheia de sonhos. Não tive mais a chance de rever os rostos deles, mas, com certeza, nunca me esquecerei de nenhum.
Celina Maria dos Santos – Incra Pernambuco